Geralmente, meus posts acabam vez por outra sendo direcionados para os mestres, esse, no entanto será diferente dos anteriores (apesar de estarmos agora em um blog novinho em folha).
Desta vez se trata de uma sugestão para direcionar mestres e jogadores de fazer de seus personagens e NPCs mais do que simples valores numéricos.
Poucas coisas me trazem mais indignação do que o trabalho que se tem para criar um personagem e descobrir depois que tudo que o jogador faz é criar um tipo de personagem-estatística. Rolam-se dados, selecionam-se perícias e características à parte e então a partida.
O personagem morre, cria-se outro, rola-se dados etc. Tudo bem, se o jogador é iniciante ou se o jogador chegou de repente e não teve tempo de bolar uma estória legal para o personagem. Vamos imaginar, por exemplo, a construção de um personagem humano guerreiro. Depois de preencher aquela ficha monstruosa, escolher a melhor arma e melhor estilos de combate o jogador se dirige ao mestre e diz que seu personagem está pronto.
Otimo. Uma ficha preenchida e perfeita para varrer todos os monstros e dragões das redondezas, mas o que muitas vezes acaba-se perdendo é a carência de uma estória que dê vida ao personagem.
Claro, o jogador pode compensar a falta de background apenas dizendo “meu guerreiro não gosta de Orcs” e reafirma “ele odeia todos os orcs” e isso acaba tendo que servir como pano de fundo. O jogador esquece por exemplo que seu personagem não nasceu ontem (pode até ter nascido, já que em RPG pode tudo, mas até pra isso o jogador precisa dar uma explicação). Vejamos...
Quando a campanha começa o guerreiro tem 16 anos de idade, por exemplo, então não existe nada nesses 16 anos que mereçam ser mencionados para a história do personagem? Levando em consideração que ele é um guerreiro e guerreiros como ele não se veem em cada esquina, então seguem mais umas perguntas: O que o torna mais especial do que alguns que pouco sabem brandir uma arma? Como suas habilidades foram desenvolvidas? Existe um mentor? Esse mentor ainda vive? É um velho que mora numa cabana sossegada como senhor Miyagi? Ou seria um grande guerreiro de grandes feitos e que agora é o braço direito do rei e por isso você agora resolveu seguir a vida de aventureiro para ser tão popular como seu mestre? E as possibilidades para criação de um background parecem nunca acabar: Você tem um inimigo? São orcs? O que faria você nutrir tanto ódio por essa raça? Eles mataram sua família? Amigos ou incendiaram a aldeia que você vivia quando era criança? Alguém da sua família sobreviveu? Onde eles vivem? Alguém mais seguiu como você o caminho de aventureiro?
Ok. Resolvi parar as perguntas para evitar deixar essa matéria muito longa e também prevejo vários engraçadinhos meio revoltados abaixo perguntando “por que não posso simplesmente fazer um personagem que bate e faz seus inimigos sangrarem?” e “eu tenho mesmo que registrar cada momento da vida do meu personagem na ficha?”. Bem, é claro que não, ora bolas! Alguns detalhes simples bastam. E se você prefere um personagem sem background, então tudo bem, vá em frente.
Mas como RPG é um jogo de interpretação então escrevo essa matéria para aqueles que querem maximizar a emoção de criar um personagem que valha a pena ser lembrado não por ter matado o lorde das profundezas com um único golpe. Até mesmo um guerreiro simples, mesmo quando morre, se faz lembrado. Vários da minha mesa de jogo já criaram estórias muito legais, mas aqui quero destacar uma que me chamou atenção.
Era um Guerreiro, mas que quando criança teve seus pais mortos. A única família lhe restado era uma irmã chama Nipur, que havia sido levada por assaltantes. Com o objetivo de encontrar sua irmã, o jovem treinou e tornou-se um habilidoso guerreiro e por onde passava fazia perguntas a respeito do seu paradeiro, deixando a cargo do mestre aproveitar ou não o background desse personagem e o destino da pobre Nipur. Agora me volto mais para o mestre.
Pois se este for preguiçoso simplesmente dirá ao guerreiro que a irmã dele foi encontrada mortinha da silva sem causa ou motivo aparente, isso, com preguiça de aproveitar a história criada pelo jogador para anexar a sua campanha estupenda que não tem espaço para nenhum personagem do jogador brilhar a não ser seus formidáveis NPCs. As vezes não é nem maldade, é aquele tal do esquecimento. O mestre pede aos jogadores que criem a estória para seus personagens e depois que a aventura começa, nada do que é dito ou escrito na estória do personagem é levado em consideração, nem mesmo num futuro longínquo. Caramba mestre! Sacanagem! As vezes isso pode desestimular que alguns jogadores se deem ao trabalho de criar uma background elaborado simplesmente por que o jogador sabe que o mestre não fará uso então, pra quê
ter o trabalho?
Fica aqui a dica aos mestres que reclamam que os jogadores só sabem criar personagens apelões mas sem nenhum roleplay. Se você, o mestre, der aos jogadores a chance de criar uma estória legal e entrar em acordo com os mesmos que o background será levado em consideração, então espere a imaginação dos jogadores fluírem.
Mantenha registros para não esquecer num futuro distante e você vai descobrir que as vezes haverá sessões de RPG que quase não haverá combates, e mesmo assim os jogadores estarão satisfeitos porque naquele momento suas estórias foram levadas em consideração. Para os curiosos em saber o paradeiro de Nipur, a irmã desaparecida do guerreiro citado acima, eu fiz com que ela fosse salva pelo vilão da história, um poderoso feiticeiro que a criou e passou a considerar o feiticeiro como pai.
Ela também se tornou uma excelente arqueira, mas não procurava por seu irmão por achar que ele já havia morrido, e mesmo depois que seu irmão morreu sem que ela soubesse quem ele era, Nipur se tornou uma personagem importante na história do mundo e ajudou no futuro a por fim a uma guerra. Uma grande campanha que os jogadores da minha mesa não esquecem, sem o qual não seria possível se não fosse aquele background bem elaborado por um dos jogadores da mesa, no momento da criação do personagem. Lembrem-se, RPG é um jogo de contar estórias, criadas não apenas pelo mestre, mas também com a contribuição dos jogadores.
Sobre o Autor:
O Gárgula. O Gárgula é professor de Literatura, desenhista e, músico, ArtDesigner e evangélico. Curte desenhos animados, mas também gosta de séries complexas e bem elaboradas que fazem as pessoas refletirem. |
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